Houve um aumento de 268 % do tráfego de bicicletas em 1 ano, no cruzamento da Avenida Duque de Ávila com a Av. da República, em Lisboa. É o que se conclui comparando esta contagem pela Rosa Félix em 2017 com esta outra contagem do Zé Nuno, em 2018:
Fixe, não é? 🙂
- 2017: 174 bicicletas particulares
- 2018: 273 bicicletas particulares + 193 GIRA
Ou seja, houve um aumento, neste cruzamento específico, de 157 % de trânsito de bicicletas particulares, e de 268 % globalmente, incluindo as do bikesharing.
O que é que significa este aumento de 268 % do tráfego de bicicletas em 1 ano?
Significa que temos mais gente a usar a bicicleta na mesma rota neste horário (8h30-10h30) de um dia útil.
NÃO significa, necessariamente que:
- haja 268 % mais bicicletas a circular em Lisboa. Precisaríamos de contagens mais abrangentes, que não existem, pois as contagens de tráfego oficiais não incluem peões e velocípedes.
- hajam menos 292 carros a circular neste cruzamento em Lisboa, neste horário. Podemos tentar saber, solicitando à CML eventuais contagens que tenham sido feitas).
- tenha havido um aumento da quota modal da bicicleta. A proporção pode ter-se mantido igual ou até reduzido, depende do aumento de viagens nos outros modos – sabe-se que em 2017 houve um aumento do tráfego rodoviário geral).
O que é que pode explicar este aumento de 268 % do tráfego de bicicletas em 1 ano?
O tempo em Janeiro e Fevereiro foi semelhante, segundo o histórico, pelo que este não será um factor.
Em 2017 o dia 22 de Fevereiro calhou a uma 4ª-feira, e em 2018 a uma 5ª-feira. Não temos dados para avaliar o impacto disto, mas da impressão que tenho de ver outros gráficos nacionais e internacionais, eu diria que até é provável que as 4ªas-feiras sejam dias mais movimentados (no geral, não só para quem vai de bicicleta) do que as 5ªas. Pelo que possivelmente esta diferença até pode ser maior entre 2017 e 2018.
“Culpados” prováveis:
- a renovação do Eixo Central
- o lançamento do bikesharing
- a degradação do nível de serviço dos transportes públicos
- o aumento de estrangeiros com o “chip” do uso da bicicleta já pré-instalado
Renovação do Eixo Central
A renovação do Eixo Central tornou a zona menos desconfortável e mais aprazível. No último ano teve tempo para ser melhor conhecida pela população – só nós, no âmbito do Recreio da Escola de Bicicleta da Cenas a Pedal, fizémos vários passeios a divulgar rotas que a incluíam. E a área intervencionada alargou-se até ao Jardim do Campo Grande.
Estas intervenções no Eixo Central tornaram-no uma rota mais apetecível face às alternativas existentes (Lisboa continua a ser hiper-permeável ao automóvel…). Isto pode significar que não terá havido, necessariamente, um aumento do número de utilizadores de bicicleta, mas meramente uma agregação dos mesmos numa mesma rota. Não saberemos porque a Câmara Municipal de Lisboa não faz contagens de tráfego de bicicletas pela cidade que permita fazer avaliações do género.
Contudo, Lisboa tem um contador de tráfego de bicicletas instalado na ciclovia da Avenida Duque de Ávila desde Fevereiro de 2016. Isto significa que já terão 2 anos de contagens – muito limitadas, claro, só num ponto da cidade, e só na ciclovia (não conta o tráfego na estrada ao lado), mas já é qualquer coisa.
https://www.facebook.com/upnorthgroup/photos/a.1418453245128348.1073741828.1407894756184197/1499154470391558/?type=3&theater
Infelizmente, ao contrário do município de Vilamoura, que tem um contador igual instalado na cidade a funcionar desde 13 de Abril de 2017 e que disponibiliza publicamente as contagens, Lisboa mantém as suas secretas. Seria bom que as incluíssem no Open Data Lx!
Por curiosidade, no mesmo dia das contagens do vídeo inicial, 22/2/2018, Vilamoura registou 166 bicicletas a passar no local monitorizado. Só daqui a uns meses se poderá analisar se também em Vilamoura haverá um aumento do trânsito de bicicletas no ponto estudado.
Sistemas de bikesharing
Entretanto, o sistema de bikesharing GIRA foi lançado no ano passado, em fase piloto, e chegou recentemente a esta zona da cidade.
Sabemos pela experiência de introdução de sistemas de bikesharing noutros países, que este é um grande despoletador do uso da bicicleta, ao normalizá-la culturalmente, e ao reduzir as barreiras à entrada no mesmo. Assim, é natural que também em Lisboa o bikesharing, as GIRA e também os sistemas sem docas que estão a chegar à cidade, tenha um grande impacto a este nível.
Outros factores
Finalmente, outras menos óbvias poderão ter contribuído para este aumento de 268 % do tráfego de bicicletas em 1 ano.
Coisas como a degradação do serviço no Metro, ou o influxo crescente de alunos, trabalhadores “nómadas digitais” e empreendedores estrangeiros, muitos que trazem com eles o hábito de andar de bicicleta.
E sabe-se lá mais o quê. É uma daquelas coisas que pedem a assistência do Freakanomics. 🙂
O que esperar do futuro?
Mantendo-se a tendência de aumento de bicicletas em circulação concentradas nas mesmas rotas, as coisas do costume. Mais colisões e conflitos associados ao aumento de utilizadores (na sua maioria sem formação em condução), aos ciclistas inexperientes que saltam logo para pedelecs, e até à estreiteza das ciclofaixas. Mais comportamentos não-ortodoxos (e mais quedas e colisões) à medida que as vias estreitas e a semaforização imperfeita frustra os ciclistas. A altura ideal para fazer este curso. 😉
Há sempre problemas para resolver. Mas ao menos que sejam fruto de algum progresso, como neste caso. 🙂