Nos últimos 15-20 dias gravei 2 entrevistas vídeo e fui entrevistada via telefone 2 vezes (uma das quais acompanhada depois por sessão fotográfica). A mobilidade em bicicleta está na televisão, na rádio, nas revistas e nos jornais. Perguntam-me sempre se Lisboa é ciclável, se há muitos ciclistas, se há cada vez mais, etc. Por curiosidade, fui ao Google trends e aqui se mostra o aumento da frequência da pesquisa por “bicicleta” em Lisboa, nos últimos anos:
Este gráfico dá uma indicação clara de que 2008 foi um ano de viragem, o interesse na bicicleta aumentou significativamente nesse ano, e tem vindo a aumentar progressivamente até hoje. Claro que aqui entra tudo o que é “bicicleta” e não apenas o seu uso para transporte utilitário ou recreativo. As pesquisas por “BTT” mostram também um aumento (e são 9 vezes mais frequentes que por “bicicleta”). Mas seja por que motivo for, há cada vez mais interesse na bicicleta e isso é bom. 🙂
Tenho a ideia de que as aparições de artigos, reportagens e afins sobre ou envolvendo o uso da bicicleta como transporte são cada vez mais comuns, mas pode ser aquele efeito, quando começamos a prestar particular atenção a determinada coisa, vemo-la em todo o lado. ;-P Para mim isso começou no início de 2005, e realmente posso dizer que desde 2008 que me parece que os ciclistas e a mobilidade em bicicleta começaram a ganhar mais visibilidade.
Hoje já me acontece com alguma frequência esperar num semáforo com outro ciclista ao lado, ou ultrapassar ou ser ultrapassada por um ciclista. Vejo vários ciclistas a passar para cima e para baixo aqui na Av. de Álvares Cabral durante a semana. E não faço ideia de quem sejam. 🙂
O IMTT está a convidar os cidadãos interessados no Plano Nacional de Promoção da Bicicleta e Outros Modos de Transporte Suaves (PNPBOMTS) (um projecto de Resolução aprovado em 2009) a darem o seu contributo na forma de resposta a um questionário, que pode ser descarregado aqui, e que deverá ser depois enviado preenchido para .
É raro pedirem-nos a opinião, pelo que devemos aproveitar a oportunidade quando nos é oferecida. É importante mostrar que somos muitos a preocuparmo-nos com as condições para caminhar e para ‘ciclar’ em Portugal. Seguindo o desafio lançado no site da MUBi, deixo aqui (PDF) o contributo da Cenas a Pedal, enviado ao IMTT a 31 de Janeiro de 2011.
Não sei bem o que pensar disto. Mas parece-me que algo está muito errado aqui.
Claro que num país de ciclões* e de ciclopasseios**, isto faz todo o sentido.
* Peões que circulam de bicicleta nas ciclovias, passeios, passadeiras, estradas, etc, como se fossem a pé, mas apenas mais depressa.
** Canais roubados a, e pintados em, passeios, para legitimar a circulação de bicicletas no passeio, transformando os ciclistas em peões com rodas.
Quando voltei à bicicleta em 2005, após um interregno forçado de 7 anos, das muitas coisas giras que descobri online ao longo de mais de um ano de ávidas e intensas deambulações e pesquisas, os pedicabs foram uma de entre várias ideias por que me apaixonei, e de cujo sonho vou acalentando. Quando, na sequência desse período de “imersão velocipédica”, resolvi criar com o Bruno a Cenas a Pedal, nos idos de 2006, esta foi das primeiras e principais ideias que acarinhámos. Em 2008, na visita à Spezi, na Alemanha, tivémos até o privilégio de conduzir um, quando apanhámos um pedicabbie muito simpático que nos levou até à estação de comboios. 🙂
Um “riquexó” é um «veículo de duas rodas para uma ou duas pessoas, puxado por uma pessoa a pé ou de bicicleta, frequente em cidades do Oriente», usando a definição da Priberam. O riquexó surgiu inicialmente como sendo, basicamente, uma carroça puxada por uma pessoa, há cerca de 150 anos.
Nos tempos mais recentes esta palavra evoluiu para incluir também versões modernas, e mais humanas, os triciclos riquexó, como os da primeira e segunda fotos, e os riquexós motorizados (tuc tucs e afins), que foram substituíndo (embora não completamente) os originais.
Na Ásia, onde surgiram e foram massificados, os pedicabs estão a desaparecer à medida que a sociedade se motoriza mais e mais (um reflexo da melhoria das condições económicas da população), e vão restando apenas como atracção turística:
Em contrapartida, no Ocidente, vão aparecendo mais e mais, também muito ligado ao turismo, mas não só, e utilizando veículos modernos, mais eficientes e menos duros para os condutores.
Há diversas marcas de pedicabs modernos, de posição de condução convencional ou reclinada, 3 ou 4 rodas, mais ou menos cobertos/fechados, com e sem assistência eléctrica, e com o condutor à frente ou atrás dos passageiros, sendo que os preços variam entre os 4.500 € e os 10.000 €, mais ou menos. Os modelos de negócio também variam, mas geralmente os condutores são trabalhadores por conta própria, que alugam os triciclos e obtêm depois o seu rendimento dos serviços de transporte (turísticos ou utilitários) que conseguem arranjar. Os proprietários dos triciclos vivem depois da publicidade nos veículos. E, claro, também há outros casos em que os condutores são funcionários da empresa. Os pedicabs são concorrência essencialmente para as charretes, onde estas existam (ex.: Sintra) e para os táxis automóveis normais.
Em 2006/2007 investigámos muito a ideia de trazer os pedicabs para terras lusas, marcas, modelos de negócio, legislação, etc, estabelecemos contacto com fabricantes, perguntámos por licenças e autorizações necessárias a Câmaras Municipais, IAPMEI, IMTT, etc. Desenvolvemos planos de negócio e até concorremos a programas de financiamento / apoio ao empreendedorismo. Infelizmente não tivémos sorte nessa frente, e o investimento inicial saía fora do nosso alcance (dois putos de 25 anos recém-saídos da faculdade, sem dinheiro nem crédito). Mas esse não era o único obstáculo, pois no processo descobri que o nosso Código da Estrada proíbe activamente o transporte de passageiros (adultos) em velocípedes. E sim, os pedicabs são classificados como velocípedes, pelo que não se tratava de uma questão de homologação nem, aparentemente, de licenças especiais locais. A resultar seria um pouco como os comboios turísticos, primeiro aparecem, depois regulamentam-se, o que são muitos “ses” para investir tanto dinheiro…
Não seríamos os primeiros tipos a usar pedicabs em Portugal, claro, nas minhas pesquisas enontrei referências a outras empresas, mas coisas pré-web 2.0, digamos assim. Haveria para aí pedicabs mas essencialmente usados em eventos e coisas do género. Com tudo isto, o sonho de nos tornarmos pedicabbies foi posto em stand-by. Mas outros tiveram a mesma ideia, e atiraram-se, apesar da legislação vigente. Houve uma falsa partida em 2007 com a Missão Zero, em Cascais, mas há hoje em Portugal, e desde 2007/2008, pelo menos duas empresas de pedicabs em operação, ambas usam a mesma marca de triciclos, embora não integrem a rede mundial de franchising da mesma.
Porque é que os pedicabs não proliferam e vingam em Portugal?
Esta questão é o exemplo acabado de como a falta de visão política e pró-actividade dos nossos políticos inviabiliza a inovação, e o desvio para a sustentabilidade nascido nas bases (vs. o que vem de cima, quando vem alguma coisa).
Há uma série de actividades com o potencial de criar emprego, de aliviar os congestionamentos, a poluição, o ruído, nas cidades, de contribuir para dinamizar a vida urbana e enriquecer o turismo, de promover social e culturalmente o estatuto da bicicleta como veículo utilitário, e de lhe dar visibilidade, que as rédeas-soltas dadas ao automóvel, a conivência das autoridades com o desrespeito pelas leis (estacionamento, circulação, velocidade,…) pelos seus condutores, e o subsidiamento público que é feito a estes, em detrimento de todos os outros modos (transportes públicos, peões, ciclistas), matam à nascença, porque o automóvel é sempre mais competitivo globalmente (vai a todo o lado, mesmo onde não pode, e estaciona em todo o lado, mesmo onde não pode, sempre impunemente). Os pedicabs são uma dessas actividades (a par da micro-logística em bicicleta, e até da publicidade móvel em bicicleta, etc).
Temos um Código da Estrada obsoleto, desajustado da realidade técnica, científica e social actual, e negativamente discriminatório dos condutores de velocípedes relativamente aos condutores de veículos motorizados.
o CE proíbe o transporte de passageiros adultos em velocípedes (mesmo que seja um desenhado e preparado para tal)
o CE proíbe os triciclos e quadriciclos a pedal (velocípedes e velocípedes com motor) de circular nas ciclovias quando estas existam (há uma série de utilizadores de bicicleta que ficam excluídos de usufruir legalmente de muitas vias turísticas e recreativas)
as ciclovias que se vêm em Portugal são subdimensionadas em largura para bicicletas normais, quanto mais para triciclos e afins (principalmente tendo em conta a lei anterior)
as ciclovias em Portugal incluem demasiadas vezes degraus, curvas cegas e/ou demasiado apertadas, etc
o piso degradado (buracos, lombas, etc), misturado com carris e empedrado, um cenário demasiado comum em Lisboa, por exemplo, torna a cidade pouco tolerável para quem não se desloca num automóvel…
O Trikidoo é uma versão light de um pedicab para levar miúdos.
De qualquer modo, aparentemente não terá sido este obstáculo legal a ditar o desaparecimento dos CityCruisers de Lisboa, mas sim a falta de licença concedida pela Câmara para estes veículos acederem e circularem por zonas pedonais (é o que depreendo da notícia, não haveria razão para terem que estacionar os triciclos em cima de passeios, podem muito bem ser parqueados na estrada). Se assim for, realmente, a história repetir-se-á para este projecto mais recente.
Sofremos, assim, duplamente, pela falta de zonas pedonais, livres de automóveis (em número, extensão e conectividade), e pela falta de tolerância para com estes transportes públicos, os pedicabs, a título de excepção, nas poucas que existem (e com maus acessos, muitas vezes). Comparem com Barcelona:
Keynote speaker: Mário Alves (Especialista em Transportes)
Que medidas adoptar no sentido de partilhar o espaço, compatibilizando os diferentes modos de circulação, as diferentes velocidades e diferentes necessidades de uso presentes na rua. É necessário conciliar, na rua, as necessidades daqueles que por ela passam, que nela residem, trabalham, comercializam, que nela socializam ou brincam, procurando garantir-se a acessibilidade para todos.
17h – sessão de cinema – documentários “O Jardim”, [Bernardo Antunes e Gonçalo Palma, 2004] e “Cidade Só”, [Ana Margarida Penedo e Cecília Dionísio, 2004]
17h30 – Keynote speaker Mário Alves 18h15 – 4 comunicações [15 minutos por comunicação]
João Nuno Ribeiro; Pedro Miguel Fonseca; João Abreu e Silva – Necessidade de criação de normas de concepção de arruamentos urbanos Nuno Travasso – Em busca do tempo perdido Luís Caetano; Madalena Beja – Sistemas de bike sharing. O caso das Bugas de Aveiro Margarida Neta – Acalmia de tráfego: A [re] conversão da cidade dos bairros 19h15 – debate – moderador João Seixas