“The Bikeman” é um “Bicycle Repair Man” dinamarquês, embora dedicado apenas aos clientes empresariais. Por cá ainda são muito poucas as empresas com vários funcionários a deslocarem-se de bicicleta, pelo que o foco do BRM é mais alargado: ciclistas na rua, serviços ao domicílio, serviços a empresas, eventos, etc. Mas quem sabe um dia não haverá lugar a especialização até nesta área? Por aqui, continuamos a trabalhar afincadamente para criar essa realidade. 🙂
Categoria: Indústria e Consumidor
A MUBi – associação pela mobilidade urbana em bicicleta, está aí para facilitar isso mesmo. 🙂
Enquanto empresa multifunções (consultoria, formação, eventos, alugueres, comércio, and beyond!), ainda teremos que aguardar até haver massa crítica local suficiente para algo similar a nível do sector. Não me refiro a uma ABIMOTA, mas a algo mais como isto, isto ou isto. De preferência não tanto como isto; para os utilizadores, há necessariamente que manter um pé atrás com uma entidade cuja missão principal é “pôr mais pessoas a andar de bicicleta mais frequentemente” quando se trata de uma associação de vendedores de bicicletas*, por isso é que são necessárias várias associações inter-disciplinares (comerciantes, académicos, técnicos, etc) e, fundamentalmente, de utilizadores, para equilibrar as coisas e conseguir destrinçar a validade das ideias da validade dos motivos. Daí a reiterada importância da MUBi.
A MUBi é uma associação de e para utilizadores, mas está aberta à cooperação de empresas (e outras pessoas colectivas públicas e privadas). Logo veremos como a Cenas a Pedal poderá apoiá-la “institucionalmente”. 🙂
*Para quem não segue estas coisas tão de perto, a Bikes Belong Coalition é uma associação de revendedores e distribuidores de bicicletas americanos que trabalha para pôr mais gente a andar de bicicleta mais frequentemente. A missão é a mesma do Cyclist’s Touring Club, no Reino Unido (com quem fizémos o nosso curso de Instrutores de Condução de Bicicleta). A diferença é que o CTC preocupa-se, antes de mais, em servir e proteger os ciclistas actuais, tentando sempre angariar mais. Já a BBC preocupa-se, antes de mais, em angariar mais ciclistas, tentando sempre servir e proteger os actuais. Isso dita as políticas que adoptam, os projectos que financiam, as cedências a nível de direitos e segurança versus aumento de ciclistas (e bicicletas vendidas…) que aceitam.
Não sei que pensar disto.
Presumo que seja melhor que venha alguma coisa para Portugal do que ir tudo para a Ásia, principalmente quando a indústria portuguesa teve um mau ano em 2009, e o país está a passar por uma depressão económica (e não só…). Contudo, já se sabe que só os gigantes aguentam modelos de negócio baseados n’”o mais barato”. E fazer mais barato do que o vizinho é sempre muito mais fácil do que fazer melhor, pelo que ser esse o factor de atracção da indústria portuguesa de bicicletas é, no mínimo, preocupante.
Não percebo o porquê de as marcas nacionais, com toda a sua história, não apostarem no próprio mercado nacional com produtos de qualidade – nomeadamente para transporte, e não inovarem em novos mercados emergentes (bicicletas e triciclos reclinados, por exemplo), nem que seja pelo ‘news value‘, for christ sake…
Quando digo “apostarem no mercado nacional” significa também trabalhar com os revendedores. Isso implica oferecer-lhes margens brutas que tornem viável trabalhar com os seus produtos (o espaço de exposição e armazenamento de uma loja paga-se – chama-se renda, luz, limpeza, seguros, etc, a assistência ao cliente antes, durante e após a compra também se paga – chama-se ordenados, formação, telefone e internet, renda da loja, etc), e implica efectivamente responderem aos contactos de novos revendedores, em vez de os ignorar e desprezar (aconteceu connosco quando começámos, há 4 anos atrás, com várias marcas e fábricas – e não somos os únicos). (Isto de trabalhar bem parece ser tão raro por cá que quando existe até leva prémios. 🙂 )
E depois, já se sabe que o barato sai caro, às vezes sem nada mudar, basta de repente uma moeda valorizar face à outra e os preços aumentam, como parece estar para acontecer na indústria das bicicletas, a nível mundial.
Programa MOBI.E: Iniciativa portuguesa de mobilidade eléctrica que tem como objectivo posicionar Portugal como país pioneiro no desenvolvimento e adopção de novos modelos energéticos para a mobilidade sustentável.
GAMEP: Gabinete criado no âmbito do Ministério da Economia e da Inovação, que tem por missão coordenar toda a dinâmica da mobilidade eléctrica em Portugal, nomeadamente, o Programa MOBI.E.
Pelo que eu percebi numa breve incursão por este tema, e por este site, o governo do meu país criou um programa que usa os recursos públicos (onde se incluem os meus impostos – pessoais e da minha empresa que vende mobilidade em bicicleta) para oferecer aos cidadãos e empresas nacionais descontos na compra de automóveis state-of-the-art, ou seja, do mais moderno possível, a cerca de 11 marcas/empresas privadas estrangeiras, bem como descontos nos impostos e nos consumos energéticos associados ao seu uso. E dão um desconto extra-grande aos pioneiros, e a quem dê um carro antigo (a.k.a. obsoleto) para abate. Tudo isto, dizem, em resposta à «crescente dependência energética do petróleo e pelo enorme impacto ambiental resultado da utilização de combustíveis fósseis», apostando assim Portugal «em novos modelos energéticos para a mobilidade, que visam melhorar a qualidade de vida das cidades e de todos nós», e contribuindo «para uma mobilidade mais sustentável». Dizem ainda que encaram «este momento como uma oportunidade para mudar a forma como nos movemos».
Na verdade, isto é uma treta. Não pretendem mudar a forma como nos movemos, pretendem apenas mudar a fonte de energia que usamos para nos mover nessa mesma forma de sempre – o automóvel particular (normalmente de uns 4 ou 5 lugares). Não visam promover uma mobilidade mais sustentável, visam promover uma mobilidade automóvel mais sustentável. É diferente.
Incentivos à substituição de automóveis por motas ou bicicletas, eléctricas ou não) ou passes sociais nas empresas? Nada.
Incentivos à substituição de automóveis por motas ou bicicletas, eléctricas ou não) ou passes sociais nas famílias? Nicles.
Compro um carro eléctrico e dão-me 5.000 € de desconto no seu preço (6.500 € se entregar o meu carro velho mas funcional para ser destruído), e ainda me isentam do Imposto sobre Veículos (alguns milhares de €uros) e do Imposto Único de Circulação (algo como 80 a 600 € / ano). E depois ainda posso deduzir 30 % do custo do carro novo (até 803 €) no meu IRS; se for uma empresa posso abater as despesas associadas no IRC. And, last but not least, pago menos impostos sobre a energia para mover este meu novo carro, em vez de 21 % de IVA, pago só 6 % (e que se lixem as consequências do Paradoxo de Jevons). Se comprar uma bicicleta com assistência eléctrica não tenho direito a nada, nem descontos, nem isenções, nem taxas reduzidas (à parte a electricidade doméstica a 6 % de IVA). Infelizmente, esta política de 2 pesos, 2 medidas, não é exclusiva de Portugal.
De notar que o IUC (pago anualmente) é um imposto associado não à circulação do veículo (motorizado), mas à sua propriedade, e tem uma componente associada à cilindrada (33 % a 55 %) e outra às emissões de CO2 (77 % a 45 %). O ISV é pago na aquisição do veículo (motorizado) novo, e tem igualmente uma componente associada à cilindrada e outra às emissões de CO2. As emissões de CO2 são o factor “ambiental” usado pelo Estado, contudo, o CO2 é só um dos muitos poluentes atmosféricos emitidos pelos automóveis, pelo que este critério de discriminação da carga fiscal pode não ser muito eficaz a promover os veículos globalmente menos poluentes. O único imposto associado à utilização dos veículos motorizados é o ISP, o imposto sobre produtos petrolíferos e energéticos, agravado depois de IVA à taxa máxima. Num litro de gasóleo, do preço final ao consumidor, 17 % é IVA, 31 % (0.60 €) é ISP, e 52 % é o custo do combustível no fornecedor. Na gasolina 95 é 17 %, 43 % (0.55 €) e 40 %, respectivamente.
Quem arrecada esta receita (ou, neste caso, quem perde receita com estas borlas do Estado)?
Estado: 100 % da componente do IUC respeitante à emissão de CO2 + 30 % da componente do IUC respeitante à cilindrada dos automóveis ligeiros; 100 % do IUC dos automóveis pesados de mercadorias e dos automóveis pesados de passageiros.
Parece que é um mau negócio para as autarquias, que continuarão a ter que suportar os custos da reparação e manutenção das estradas municipais degradadas pela circulação automóvel, perdendo, no entanto, as receitas associadas a esses automóveis (bom, a parte deles, Lisboa, por exemplo, recebe um fluxo brutal e anormal de carros vindos de outros concelhos, face aos carros locais, o que levanta este problema mesmo previamente a este programa do Governo).
Um pormenor interessante também é que, quanto mais cara à partida for a energia usada por um veículo, maior a receita do Estado em IVA, ou seja, quanto mais caro e ineficiente for o veículo em termos de consumo energético, mais proveitoso no imediato para o Estado. Isto significa que o Estado prefere ter-nos a todos a mover-nos sozinhos em carros com capacidade para 5 pessoas + carga do que em bicicletas [com assistência eléctrica]… E o ISP é a 4ª maior fonte de receitas fiscais para o Governo português. Ocorre-me perguntar qual é a contrapartida à perda desta enorme fonte de receita (e também desta), dado que a maior parte dos gastos e perdas públicas com os automóveis continuarão a existir (manutenção de vias, sinistralidade rodoviária, congestionamentos, etc) quando forem todos eléctricos. Sim, porque não me parece que o Governo abdique dela por suspeitar que vai valer a pena com o que vai poupar só na Saúde (menos doenças graças aos carros mais silenciosos e com menos emissões poluentes). Talvez isso não seja o suficiente. Terá a ver com algo mais macroeconómico, a nível da balança das importações / exportações de energia?…
Seja como for, está a parecer-me cada vez mais que quem não anda de carro está a subsidiar cada vez mais o uso de carro pelos outros. Toda aquela história, mais popular nos países com poucos ciclistas mas em crescimento (tipo EUA e Reino Unido) de “são os automobilistas que pagam as estradas“, implicando que são os donos destas e querendo afastar delas aqueles que eles vêm como parasitas – os ciclistas, que não pagam Imposto sobre Veículos, Imposto Único de Circulação, Imposto sobre Produtos Petrolíferos, e IVA sobre o combustível, nunca fez sentido (são impostos que visam pagar os prejuízos provocados pelo uso do carro, não visam pagar a construção da infra-estrutura, isso vem da receita fiscal geral), mas o oposto começa a fazer. Apetece dizer a quem está nos carros, quando saímos de bicicleta, “saiam daqui e deixem-me passar, respirar e ouvir os pássaros, o vento e as pessoas, porque vocês não pagam o suficiente para compensar o que fazem à cidade…”
Quanto ao Mobi.e, se incluísse as bicicletas com assistência eléctrica, promoveria a adopção da bicicleta como meio de transporte tal como o faz com o carro eléctrico. Teria ainda a vantagem de permitir às pessoas investir em modelos mais baratos, com menor autonomia, e mais leves, porque haveria vários pontos ao longo do caminho onde poderiam recarregar a bateria.
Seria simpático, para não dizer simplesmente de elementar justiça e coerência com a alegada preocupação em «promover modos de transporte mais sustentáveis», anunciada com a aprovação do “Plano Nacional de Promoção da Bicicleta e outros Modos de Transporte Suave”, para o qual até criaram um Grupo de Trabalho inter-ministerial e tudo…
Vejo com agrado a introdução de carros eléctricos nas nossas cidades, visto que os principais inconvenientes que encontro ao deslocar-me de bicicleta por elas, logo a seguir ao mau estado das infra-estruturas viárias, são a exposição à poluição atmosférica e sonora causada pelos automóveis (nomeadamente pelo puro excesso deles), que tornam a viagem desconfortável e, no limite, afectam a minha saúde. Contudo, sinto-me muito lesada enquanto cidadã pela forma como o programa de incentivos foi implementado, porque me parece claro que não integra uma estratégia simultânea de redução da competitividade do automóvel particular (eléctrico ou não) em meio urbano, não resolvendo assim muitos dos problemas graves, causados ou agravados pelo excesso de automóveis, que diminuem a minha qualidade de vida enquanto residente e trabalhadora na cidade. E sinto-me lesada enquanto utilizadora de bicicleta como principal opção de mobilidade (a par do andar a pé e do recurso ocasional aos transportes públicos), porque pago 21% de IVA sobre todo o equipamento que comprar para me deslocar de bicicleta, e não tenho acesso a estações de carregamento públicas onde pudesse recarregar a bateria de uma bicicleta eléctrica, e se quiser ter formação em condução e segurança rodoviária ou simplesmente aprender a andar de bicicleta para a usar depois como exercício físico, pago tudo a 21 %. Não beneficio de incentivo, desconto ou isenção nenhuma. E sinto-me lesada enquanto empresária porque o Estado não apoia esta nova tecnologia para uma mobilidade mais sustentável e uma maior eficiência energética que é,… tchanan… a bicicleta, e a bicicleta com assistência eléctrica, subsidiando a compra destes produtos (e serviços) e oferecendo incentivos fiscais, e ainda vai fazer isso mesmo (usando também o meu dinheiro) a quem pode ser considerado meu concorrente directo…
E António Costa, da autarquia de Lisboa, que, pelo Vereador José Sá Fernandes, recentemente tem investido em pavimentar faixas em passeios e permitindo e obrigando os ciclistas a circular pelos passeios dos peões em vez de na estrada dos veículos, com o pretexto de servir para promover o uso da bicicleta (tal como o serviço de bikesharing que têm estado a tentar implementar), tido como um objectivo do actual executivo, acha que «o carro eléctrico vai ser uma revolução para as cidades do séc. XXI». Não faz por menos, uma “revolução”. Vai concerteza revolucionar os inaceitáveis níveis de sinistralidade rodoviária, a epidemia da obesidade (e doenças associadas), os congestionamentos que nos dão doenças mentais e nos tiram produtividade, o estacionamento selvagem, a falta de espaço público de estadia, recreio, etc, and so on. É um milagre, o carro eléctrico.